31 março 2013

Palavras de Domingos Dutra


"Essa comissão é dos ciganos, é da comunidade gay, da comunidade homossexual, das lésbicas, das prostitutas. Porque eles são brasileiros, pagam impostos, votam, e merecem ter a proteção do Estado Brasileiro.
Essa comissão é dos evangélicos, dos católicos, daqueles que não tem religião, daqueles que professam religião de matriz africana.
(...)
Por isso, em nome disso, eu não posso concordar que a nossa gestão termine com a população proibida de chegar à nossa comissão. Por isso, eu saio, renuncio, abro mão, não fico numa sessão aonde o povo brasileiro foi excluído." - Domingos Dutra

Essa comissão não é mais a Comissão dos Direitos Humanos.

25 fevereiro 2013

Porque o monopólio emburrece?



E é anunciada a segunda temporada do seriado escandinavo The Bridge. Os ingleses ficam felizes. A série passa na tevê britânica com legendas.

O fato: Bridge pegou.

Saga, a detetive sueca, cabelos loiros sempre soltos, uma cicatriz no lábio que a torna ainda mais atraente, já rivaliza com Sarah Lund, de The Killing, outra série escandinava de sucesso internacional.


Antes que eu fale sobre a história, a pergunta essencial: por que no Brasil não fazemos nada que preste na televisão? Por que somos humilhados em qualidade até pela Escandinávia com seus recursos limitados?

Tenho minha tese: a estética da novela massacra a criatividade. Filmes e séries no Brasil têm uma semelhança irritante com as novelas da Globo. Mesmos atores, mesmos diretores, mesma limitação, mesma falta de surpresa e inovação.

O florescimento do cinema e da tv na Escandinávia está conectado ao grupo Dogma, um conjunto de cineastas iconoclastas e brilhantes entre os quais se destacava Lars von Trier, um dos últimos gênios da direção. The Bridge é um dos filhos do Dogma.

Nosso Dogma, lamentavelmente, é a novela das 9. Que não faz você pensar, e sim tomar cerveja. Me conta um amigo publicitário que em Avenida Brasil tudo era motivo para tomar cerveja, por causa do dinheiro colocado pela Ambev não em propaganda direta, mas no controvertido e perigoso ‘product placement’, o popular mercham. Nele, você consome publicidade disfarçada no meio do conteúdo.

Quer dizer, os personagens da novela bebiam desmedidamente cerveja não porque tivessem propensão a alcoolismo, mas por conta de um contrato milionário firmado pela Globo. Na Inglaterra, bebidas alcoólicas são proibidas de aparecer subliminarmente, para que não seja estimulado um hábito ruim para a saúde.

A história de The Bridge gira em torno de um cadáver descoberto na ponte que liga Suécia e Dinamarca. Dois, na verdade. O corpo parece ter sido serrado no meio. Mas a perícia logo descobre que a parte de cima é de uma mulher e a de baixo de outra.

Logo aparece Saga, absolutamente desinibida, e domina a trama. Quando quer sexo, ela vai a um bar e escolhe um homem. Depois leva para seu apartamento. Saciada, volta ao trabalho de investigação e esquece o homem. O melhor diálogo da série é entre ela e seu parceiro de polícia.

“Que você fez ontem?”, ele pergunta.

“Sexo”, ela responde, com a naturalidade que teria se tivesse dito que foi visitar uma velha tia reumática.

As novelas brasileiras não emburrecem apenas o público. Também os diretores e atores ficam mais burros.

Tropa de Elite 1 poderia ser a semente de uma renovação. Mas não foi nada. A sequência já parecia uma paródia. Triunfou o espírito das novelas.

Maldição eterna a elas.

07 fevereiro 2013

Sobre o carnaval

É próprio da raça humana a celebração, a festa, seja ela religiosa ou profana, seja coletiva ou particular. Mas o que é celebrar? Celebrar é realizar, festejar, comemorar com solenidade, exaltar; enaltecer, elogiar publicamente. Mas o que temos para celebrar?

Com essa indagação fico pensando que podemos tomar a evolução do carnaval no Brasil do século passado como um recorte explicativo das transformações e manutenções do poder ocorridas nacional e internacionalmente na sociedade.

Começamos o século com uma grande tensão internacional, que veio degenerar em uma guerra mundial com suas centenas de milhares de mortes, mas tínhamos Carmem Miranda para animar as tropas com suas marchinhas e chanchadas.

Como a Primeira Grande guerra engatilhou a Segunda e a revolução de 1930, a Era Vargas, também o Brasil evoluía em sua capacidade de vencer-se no que tinha de mais peculiar: sua afinidade irrefletida para a festa sem se ter o que festejar!  E, assim, saímos dos salões de bailes e ganhamos as ruas, não para protestar e levantar nossas vozes, mas para crescer a festa e a voz dos que jogavam confetes e serpentinas para o nazi-fascismo que imperava lá e cá. E, então, em meados de 1940, consolida-se um novo modelo de relações internacionais, período que também foi batizado com nome de guerra – Fria. E na Terra Brasilis? Bem, aqui surge o trio elétrico e uma tentativa democrática, que fracassa pelo Golpe Militar de 1964 e reforça a ideia de que atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu ( nos porões da Ditadura). E o único coro que valeria a pena ( o dos descontentes) é amordaçado pela censura.

Voltamos a ter uma tentativa de democracia: Diretas Já! O Tio Sam nos permite uma certa autonomia política, mas não econômica; a divida interna e externa crescem e a indústria fonográfica também: explode o axé e o carnaval se internacionaliza para o novo mundo globalizado.

Somos atração para o globo, um modelo de (anti?) cultura. Dominamos o mundo em fevereiro! Apimentamos Woodstock, com isso, 'sexo, drogas e rock’n’rol' tornam-se prostituição, drogas e gingado tipo exportação.

Em última análise, sociologicamente falando, carnavalizamos a miséria, a corrupção e a divisão de classes com uma única corda, que separam os associados dos que pulam fora do trio (carinhosamente conhecidos como ‘pipocas’). Que antes todos pulassem fora da alienação e engrossassem a marcha dos protestos que sempre existem, pois esse pode ser o país do carnaval, mas não pode ser, com certeza, o nosso país.

05 janeiro 2013

Últimas palavras à nação

Salvador Allende Gossens, 11 de setembro de 1973
(Clique aqui e baixe o áudio do discurso.)


“Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineros.”

Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores:

Não vou renunciar!

Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.

Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.

Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.

Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças.

Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista.

Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta.

Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos.

A historia os julgará.

Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranqüilizar, mas tampouco pode humilhar-se.

Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino.

Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se.

Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile!

Viva o povo!

Viva os trabalhadores!

Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição.


Notas:
Discurso do Presidente Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, dia do golpe de Estado que derrubou o governo da Unidade Popular e implantou a sanguinária ditadura militar comandada pelo general Pinochet. O Palácio presidencial foi bombardeado pelos militares e Allende morreu de armas na mão resistindo ao golpe.

Fonte: MIA

04 janeiro 2013

Nova era na Igreja Católica

No início do século XVIII a história intelectual e cultural Ocidental passou por uma verdadeira revolução. Foi o chamado Iluminismo. Só para ilustrar o momento, cito a Revolução Francesa e a queda da maioria dos Estados absolutistas europeus. 

A Igreja Católica então perdeu poder, já que sobrevivia acoplada aos Estados, como sanguessuga. Foi o momento em que os Estados se tornaram laicos. Acredito que no momento atual, a Igreja Católica esteja passando por uma segunda fase do Iluminismo. Alguns pontos fundamentais que a levará a sobreviver pelo menos mais mil anos:

O Papa perderá sua "infalibilidade".

O Papa terá que permitir o casamento dos padres, já que poucos sobreviverão ao “tsunami pedofílico” que varre a instituição como um todo. As mulheres atingirão postos mais altos na hierarquia da Instituição (na Alemanha existe uma certa pressão nessa direção).

Terá que cair também o silêncio em torno da proibição dos padres reconhecerem seus filhos. Isso é mais uma vergonha no seio da Igreja Católica. A Instituição medieval nega o direito básico dessas crianças. A negação da paternidade é tão vergonhosa quanto a pedofilia crônica na Igreja. Pena que o Papa hoje em Malta expresse "dor e vergonha" apenas às vítimas de pedofilia.

Já li diversos livros com depoimentos de mulheres e filhos de padres, de cortar o coração. Crianças que se tornaram desajustadas, sem referência paterna. Muitas vezes tiveram que viver na mesma casa com os pais (aquela velha história da governanta do padre. O irmão do papa ‘cara de águia’ também vive com uma “governanta”) e mentir para o mundo exterior o que viviam na residência do ‘representante de Deus na terra” no interior. 

Espero que quando esse tsunami surja na mídia, a Igreja e o papa não venham dizer que não sabiam do caso. E vejam, essa Igreja que calou durante séculos sobre a pedofilia e a existência de filhos de padres sem o reconhecimento da paternidade é a mesma que condena o aborto.

É muita hipocrisia!

Acredito, porém que depois da catarse pela qual a velha instituição passa, virá a bonança. Surgirá uma Igreja mais limpa do autoritarismo cáustico e das mentiras que a tem dominado por tantos séculos.

02 janeiro 2013

Eduardo Galeano: Carta ao Senhor Futuro

Para começar bem esse ano, faço a reprodução de um texto belíssimo do grande escritor Uruguaio, autor do primeiro livro que li, "As veias abertas da América Latina", Eduardo Galeano. Vale a pena ler.


Prezado Senhor Futuro,

Com a minha maior consideração: 

Estou lhe escrevendo esta carta para pedir-lhe um favor. O senhor saberá desculpar-me o incômodo. 

Não, não tema, não é que queira conhecê-lo. O senhor há de ser muito solicitado, haverá tanta gente que quererá ter o prazer; mas eu não. Quando alguma cigana me toma a mão para ler-me o porvir, saio correndo em disparada antes que ela possa cometer tal crueldade.

E, no entanto, você, misterioso senhor, é a promessa que nossos passos perseguem querendo sentido e destino. E é este mundo, este mundo e não outro mundo, o lugar onde o senhor nos  espera. A mim e aos muitos que não acreditamos nos deuses que nos prometem outras vidas nos mais longínquos hotéis de Mais Além.

E aí está o problema, senhor Futuro. Estamos ficando sem mundo. Os violentos o chutam, como se fosse uma bola. Jogam com ele os senhores da guerra, como se fosse uma granada de mão; e os vorazes o espremem, como se fosse um limão. A este passo, temo, mais cedo do que tarde, o mundo poderá ser não mais do que uma pedra morta girando no espaço, sem terra, sem ar e sem alma.

Disso se trata, senhor Futuro. Eu lhe peço, nós lhe pedimos, que não se deixe desalojar. Para estar, para ser, necessitamos que o senhor siga estando, que o senhor siga sendo. Que o senhor nos ajude a defender a sua casa, que é a casa do tempo.

Quebre-nos esse galho, por favor. A nós e aos outros: aos outros que virão depois, se tivermos depois. 

Saúda-te atentamente, 

Um Terrestre

Eduardo Galeano

01 janeiro 2013

Os 54 anos da Revolução Cubana: o que ela representa?


Entrada dos revolucionários cubanos na cidade de Havana, em 1 de janeiro de 1959. 

A revolução cubana não foi apenas a segunda independência de Cuba. Ela foi uma luz para a América Latina. Uma pequena ilha havia se levantado contra um império, contra a tirania do imperialismo. A luta contra esse império segue até hoje. Durante os últimos 54 anos, os cubanos vem enfrentando uma série de ataques. Mas eles resistem. E resistem porque, caso fracassem, sabem que tem duas coisas muito preciosas a perder: a liberdade e a independência.

E Fidel, o que dizer dele? Foi sem dúvidas o maior chefe de governo da história do continente. Não houve líder mais capaz, honesto, corajoso e leal ao povo. Enfrentou a própria família para garantir os interesses populares. Sua família, formada por proprietários de terras, não escapou da reforma agrária, tendo suas propriedades coletivizadas.

O dia 1 de janeiro ficará marcado para sempre como o dia em que um grupo de jovens rebeldes triunfou sobre a injustiça, a opressão e a exploração. Os guerrilheiros de Sierra Maestra são e sempre serão um exemplo para aqueles que acreditam na construção de um mundo mais justo, onde homens e mulheres não tenham mais que se vender para sobreviver, um mundo onde o trabalho deixe de ser um simples instrumento de um pequeno número de homens imoralmente ricos, que o exploram diariamente para seus fins, para se tonar numa fonte de liberdade humana.

A revolução cubana, pouco a pouco, transformou Cuba em uma democracia popular. A suposta ditadura castrista tão falada pela mídia capitalista e até mesmo por parte da esquerda é, na verdade, o regime mais democrático do mundo.

Por que Cuba seria uma ditadura? Por que há um sistema de partido único? Definir a democracia como pluripartidarismo é uma deformação do significado original da palavra, que significa "poder do povo". Quanto maior a participação do povo nas decisões políticas, mais democracia se tem. E ninguém pode afirmar honestamente que em Cuba o povo não tem participação efetiva na política. Quem conhece o modelo cubano sabe que em nenhum lugar do mundo os trabalhadores tem tanto poder.

O que é mais democrático do que um sistema onde até os candidatos a cargos políticos são escolhidos diretamente pelos eleitores, enquanto em países como o Brasil e os EUA são os partidos que decidem quem serão os candidatos? Além disso, em Cuba, os representantes podem ter seus mandatos revogados a qualquer momento.

É sempre importante repetir que o Partido Comunista de Cuba não tem caráter eleitoral. Ele não indica candidatos, não faz campanhas políticas. O PC cubano tomou desde o primeiro momento medidas para combater a burocratização do partido. Que outro partido do mundo, por exemplo, só aceita novos membros caso eles sejam aprovados por assembleias de trabalhadores?

Não estou dizendo que tudo na política cubana é perfeito. Mas chamar Cuba de ditadura é uma completa falta de conhecimento sobre o que é poder popular. No máximo, poderíamos exigir ainda mais democracia no país. A democracia sempre pode ser ampliada, isto é, a participação dos cidadãos nas decisões políticas sempre podem ser elevadas a um novo grau.

Cuba, hoje, passa por uma série de reformas econômicas, que visam modernizar a economia do país. Podemos dizer que o governo de Raul Castro está democratizando a economia. A intenção é ampliar o controle da sociedade sobre as atividades econômicas.

O Partido Comunista de Cuba permanece fiel ao socialismo, mas seus dirigentes e líderes tomaram consciência de que o socialismo cubano precisar ser renovado. É claro que há sempre a possibilidade de um golpe de burocratas pró-capitalismo destruir o sistema socialista do país, como ocorreu no leste europeu, mas por enquanto não há nenhum sinal de que isso possa ocorrer em Cuba. Mas sabe-se que, enquanto existirem países capitalistas no mundo, o socialismo não terá triunfado. O socialismo cubano, então, só triunfará realmente, caso encontre apoio em uma revolução internacional. A questão é, Cuba socialista, surgida do socialismo do século XX, viverá para ver o novo socialismo? Só o tempo nos dará a resposta.

A revolução deu ao povo cubano, entre outras coisas, democracia, educação, saúde, moradia, alimentação digna, segurança e trabalho para todos. Essas conquistas precisam ser preservadas, mas isso significa uma luta contra as forças que insistem em tentar destruir a independência e a liberdade dos cubanos. E não é apenas uma luta contra forças inimigas imperiais, é também uma batalha contra qualquer ameaça burocrática que tente transformar o sistema político de Cuba em um oligarquia.

Marx, Engels e Lênin alertaram para a ameaça que representa a burocracia. Foi pensando nisso que Engels disse na introdução ao texto de Marx "A Guerra Civil na França" que, em uma sociedade socialista, seria preciso cortar os piores aspectos do Estado desde o primeiro momento. E, na minha visão, isso significa uma luta permanente para fortalecer os órgãos de poder popular, ligados à sociedade. Seguindo o exemplo dos três gigantes fundadores do socialismo científico, os trabalhadores cubanos devem sempre estar atentos a qualquer desvio burocrático.

Que a revolução cubana não seja apenas mais uma data famosa da história, que ela sirva de exemplo e inspiração para todos os povos trabalhadores do mundo, os únicos capazes de jogar no lixo da história a exploração e derrotar a ditadura do capital. Viva Cuba livre!

02 dezembro 2011

Sobre Belo Monte

Por Paulo Daniel

Vídeo que satiriza produção de globais em campanha contra Belo Monte. Imagem: Reprodução Youtube

Nos últimos dias, principalmente no mundo digital, muito se falou de dois vídeos. Um com uma excelente produção e atores globais, diga-se de passagem, com um razoável conteúdo contra a construção de Belo Monte e, outro, realizado em sua maioria por estudantes da Unicamp (Universidade de Campinas) e, também, com excelente conteúdo, entretanto, em defesa da construção da Usina Hidrelétrica no Pará. Em ambos a questão central discutida é o meio ambiente. Neste sentido, gostaria de ampliar as provocações ou, quem sabe, talvez, procurar discernir algo.

As palavras “ecologia” e “meio ambiente” mantêm um grau elevado de neutralidade diante dessa realidade. Elas se tornaram impróprias e perigosamente inadequadas, de forma que seria necessário substituí-las por outras mais apropriadas. Isso só poderá ser feito no quadro de uma crítica renovada do capitalismo que vincularia, de forma indissociável, a exploração dos dominados pelos possuidores de riqueza e a destruição da natureza e da biosfera.

Para entender as relações do capitalismo com suas condições de produção “externas”, é necessário retornar às origens e aos fundamentos sociais desse modo de produção e de dominação social. A guerra travada pelo capital para arrancar o campesinato à terra e para submeter a atividade agrícola inteira e exclusivamente ao lucro, da qual vivemos novos episódios hoje em dia, é uma guerra fundadora do novo modo de produção e das formas sociais de dominação que lhe são próprias.

Leia também:


Marx foi quem melhor explicou as consequências, digamos, ecológicas do capitalismo. Na longa quarta seção do livro I do Capital, sobre a produção da mais-valia relativa, ele trata da exploração dos operários agrícolas e industriais no quadro de desenvolvimentos mais amplos sobre a relação entre a agricultura e a grande indústria. Uma leitura minimamente atenta indica até que ponto, para Marx, a ideia de progresso está subordinada à de revolução: “Com a crescente preponderância da população das cidades que ela aglomera em grandes centros, a produção capitalista, de um lado, acumula a força motora da história; de outro lado, ela destrói não somente a saúde física dos operários urbanos e a vida intelectual dos trabalhadores rústicos, mas ainda perturba a circulação material entre o homem e a terra”.

Hoje como ontem, em condições históricas distintas, toda a questão está na capacidade de auto-organização dessa população, majoritariamente urbana, de vendedores de sua força de trabalho a ponto de ser capaz de desempenhar esse papel de “força motriz da história”, isto é de sujeito político decidido a acabar com o capitalismo.

Na ausência ou numa situação de paralisia de tal sujeito político, o que domina é a consolidação e a acentuação de um processo em que “cada progresso da agricultura capitalista é um progresso não somente na arte de explorar o trabalhador, mas também na arte de depenar o solo; cada progresso na arte de aumentar a fertilidade por um certo tempo torna-se um progresso na ruína das fontes duradouras da fertilidade. Quanto mais um país, os Estados Unidos por exemplo, se desenvolve na base da grande indústria, mais rápido ocorre esse processo de destruição”. E Marx terminava com essa frase da qual se fez uma utilização teórica bastante, ou mesmo muito limitada: “A produção capitalista só desenvolve a técnica (…) esgotando as duas fontes das quais jorram toda a riqueza: a terra e o trabalhador”.

Portanto, a necessidade da construção de grandes centrais hidrelétricas na Amazônia deriva, não só porque deverá arrefecer o movimento de aumento do preço da energia no mercado atacadista, mas também, para a manutenção do multifacetado capitalismo brasileiro. É intrínseco ao capital sua acumulação e produzir uma enxurrada de mercadorias, por isso, a energia é essencial, não somente para a utilização dos “i tudo”, mas para sua produção. Além do que, me desculpem meus(minhas) amigos(as) verdes, mas não é possível discutir energias alternativas no capitalismo, isso é, tão somente só, paliativos e marketing ambiental.

O ator Ary Fontoura é um dos globais que participa da campanha satirizada pelos alunos da Unicamp. Imagem: reprodução Youtube

Por fim, o vídeo dos globais me coloca em dúvida. São contra a construção de Belo Monte, pois a oferta de energia aumentará e, por sua vez, de acordo com sua distribuição (neste sentido, o Estado é essencial para regular, distribuir e interferir nesse tipo de mercado), tenderá a diminuir aqueles(as) que vivem nas trevas? Ou porque são realmente contra o processo produtivo que estamos vivendo, ou seja, o capitalismo? Se, for pela segunda opção, sugiro um segundo vídeo; com o seguinte tema: Produzir o quê? E para quem?

Será que alguém toparia?


Fonte: Carta Capital

23 novembro 2011

O Deus autoritário

A construção de um Estado democrático e o conceito de democracia estão presentes na humanidade desde a formação da confederação de Delos em 477 a.C., quando a Grécia se transformou, pouco a pouco, em notável império militar e democrático. É importante lembrar que conceitos filosóficos e ideológicos, classes sociais, hegemonias circunstanciais, materiais e militares determinam a forma, o conceito e o modelo de Estado e de democracia que se estabelece nas sociedades em cada tempo histórico, desde sua fundação em Atenas.

Passados dois mil e quinhentos anos desde as primeiras iniciativas de constituir Estados democráticos e sociedades democráticas, é que a humanidade se depara com os limites impostos às nações, populações e povos de todo mundo pelos impérios dominantes. Hoje, no contexto histórico em que vivemos, é o setor financeiro como base nas principais economias que impõe seus objetivos até mesmo sobre os direitos políticos da democracia burguesa. Em pleno século XXI, a humanidade vive sob a hegemonia neoliberal, mais especificamente sob a ditadura dos mercados financeiros, desregulados e descentralizados.

Sócrates, um dos maiores pensadores da humanidade foi condenado a ingerir cicuta por um tribunal popular em 399 a.C. por defender a radicalização da democracia. O filósofo morreu acusado por não reconhecer os deuses do Estado, introduzir novas divindades e de corromper a juventude. Sócrates, que dizia: apenas saber que nada sabia; questionava os valores morais e religiosos que orientavam a conduta dos indivíduos e que serviam de base às instituições políticas do seu tempo. Do mesmo modo que gregos de hoje questionam os valores do deus mercado e as suas instituições financeiras internas e externas, que os submetem a um duríssimo ajuste econômico que representará a miséria e a desesperança de milhares de homens e mulheres da velha Grécia, descendentes de Sócrates e Platão.

Ocorre que a tragédia grega não se limita às atrocidades financeiras, aos cortes sociais, ao desemprego, ao aprofundamento da miséria, a destruição de um Estado, berço da civilização ocidental. Hoje, assim como há dois mil e quinhentos anos, a principal vítima na Grécia é a democracia, mesmo limitada e inconclusa, mas referência incontestável do sistema capitalista contemporâneo. Sócrates foi condenado à morte por questionar os deuses do Estado. Chamava seus discípulos à razão, ao questionamento das normas de conduta política. A virtude para Sócrates é o conhecimento absoluto.“O Homem é a medida de todas as coisas”.

Se os deuses do Estado levaram Sócrates à morte, agora é o Deus mercado que leva à morte a democracia, o emprego, a soberania, o futuro da nação grega. O Deus mercado decretou o fim do Governo Papandreou, de tendência social democrata, pois o mesmo diante da falência do Estado, da pressão da Comunidade Europeia, da prepotência do Banco Central Europeu, do FMI - Fundo Monetário Internacional, dos famintos credores internos e externos, resolveu consultar o povo grego por via de um plebiscito. O primeiro Ministro grego, emparedado pela banca mundial, propôs consultar a população e dividir com os gregos a crise do país para escolher o melhor caminho a seguir, diante da grave situação. A resposta foi fulminante em menos de quarenta e oito horas estava deposto o gabinete do governo grego. A banca internacional decretou: não cabe ao povo decidir, não cabe aos eleitores e aos governos estabelecer qualquer mediação democrática, quando o que está em jogo são os interesses do poderoso sistema financeiro global.

A ação política de pena máxima à democracia e ao Estado de direito grego foi mais letal que a cicuta aplicada a Sócrates pelo tribunal de Atenas. O mercado afastou em tempo recorde o primeiro-ministro grego Papandreou. Indicou como substituto um novo representante, banqueiro do FMI, íntimo do mercado financeiro: o primeiro ministro Papademos. A missão foi imediatamente cumprida, mudou o governo, aprovou o projeto financeiro imposto pela banca internacional “demônios” do capitalismo na atualidade.

O nome Papademos não poderia ser tão oportuno, ou seja, se o sujeito papa o demo, o que não fará aos trabalhadores. Conforme os articulistas da grande mídia rentista nacional e internacional, o novo governo Grego é um governo técnico. Em resumo, a democracia, desde os tempos de Sócrates, serve somente quando os interesses do poder constituído não estão em cheque, pois do contrário rasga todos os princípios e códigos que norteiam a famigerada democracia burguesa. Nos tempos atuais, a economia rentista domina a política, fixando e impondo a sua agenda. Marx, em artigo publicado em abril de 1853 dizia: “o mínimo que se pode dizer de um governo técnico é que ele representa a impotência do poder político em um momento de transição.

O mundo está diante de um dilema: construir uma nova alternativa política, econômica e social para a humanidade ou sucumbir diante de um Deus autoritário, covarde e sedento de crises e miséria. O que fica evidente nesta crise europeia, que ainda muito teremos que avaliar é que inevitavelmente morreu a democracia capitalista liberal. Não somente na Grécia, mas também na Itália. A resposta em todo o mundo tem sido ainda inconsistente, mas os movimentos embrionários nos Estados Unidos, Europa, Norte da África e no Oriente poderão assumir novas dimensões. É hora de ampliar a luta anticapitalista e propor novos rumos para a humanidade. Viva a democracia proletária, viva Karl Marx.

20 novembro 2011

O vírus do trabalho

Não tem remédio, não tem cura, não tem solução. Esta espalhado aos quatro cantos, está arraigado em cada cristão, evangélico, homofóbico, gente de boa índole, moço de família, conservador dos bons costumes, pequeno e grande burguês a ideologia burguesa, de que trabalhar é a única dignidade que resta, aos pobres mortais. Feridos em suas dignidades, os pobres desempregados, se estapeiam em filas, em vias de retrocesso, deixam seus nomes, e suas funções, estão as ordens, prontos para produzir, reproduzir, regozijar da vida assalariada. Quem diria, que o trabalho, com suas inúmeras transformações, sendo o fenômeno fundante do ser social, aquele saudoso trabalho, espontâneo, regulador das atividades biológicas, primárias, básicas, tido como intercâmbio do homem com a natureza, para a produção das necessidades reais, estivesse tão próximo, do abismo em que se encontra, abismo coberto pelo véu da mercadorização, da coisificação do homem, da fetichização das mercadorias.

A essência do trabalho estava justamente nestas relações diretas com o instrumento de trabalho, com os produtos deste trabalho, e com a real necessidade de se trabalhar. Vejam só como estamos subordinados a ideia de que o trabalho, ainda esta ligado as minhas necessidades primárias. Mas qual a relação direta que temos com o nosso trabalho, seja produtivo ou improdutivo, seja um assalariado ou um operário? Toda esta fragmentação que me distancia de quem eu sou, e das minhas reais necessidades, e como tudo isso se interliga de modo fascinante no sistema de metabolismo social do capital, só me fazem descolar-se ainda mais de tudo aquilo que até então, julgava a unica verdade. Para isso, aprendi a função dos paradigmas. Se não compreendermos as origens e as transformações do trabalho, que o subordinou as necessidades de reprodução do próprio sistema, com a fragmentação, o afastamento do sujeito da objetividade e da totalidade da produção de sua própria vida, não seremos capazes de discernir, o nosso verdadeiro papel no mundo do trabalho e das relações humanas que se inserem na sociedade capitalista.

Quem blasfemaria contra a ideologia capitalista dizendo sobre o horror de se ter que trabalhar de 8 a 14 horas diárias? Quem poria em discussão o horror de ser obrigado a viver em função de produzir coisas que não lhe dizem nenhum respeito, de ter que acordar cedo todos os dias, de fazer horas extras, de não ter tempo verdadeiramente livre? Quem atentaria contra o sistema de produção que move o mundo, que move a economia, que faz o dinheiro e as mercadorias girarem? Quem faria a critica aos lucros exorbitantemente incomparáveis em relação ao salário pago aos empregados?

Na verdade, por dentro, os trabalhadores agonizam aprisionados ao ódio que se mistura a conformação anacrônica, não exteriorizam de modo contundente, e culminam no ciclo vicioso e estático que torna imutável, incurável, é o vírus. A doença, que torna pálido, anêmico, de cama, que mata veladamente, eles inventam de tudo, televisão, praças, shoppings, ginásticas laborais, tentam manter vivos, afinal, são mão de obra, são massa, mas se morrem, eis que nascem outros tantos sem berço, sem o sangue burguês.

Me pergunte a fórmula da riqueza, e responderei, nasça rico, ou dê jeito de explorar o trabalho de outrem. Seja o dono do meio de produção, e da matéria prima, seja o intermediário dos outros homens, com seus meios de subsistência, e lucre milhões com isso. Alie-se ao mercado, a competição, ao consumismo, a alienação. Parece fácil? Se fosse, não teríamos tão poucos com o verdadeiro poder nas mãos. Assalariados que ganham mais, outros ganham menos, uns mandam, outros obedecem, e isso é tão óbvio, a classe é uma só, mas nunca vão concluir isso por si mesmos enquanto o sistema fragmentar as relações humanas e de trabalho.

Como zombies, admiram quem trabalha noite e dia sem parar, se orgulham, e dão exemplos as gerações seguintes, reproduzem os paradigmas. Mortos vivos, vão e voltam para suas casas, onde permanecem com a televisão, quando muito os livros, alguns estudam, buscam de certa forma se libertarem, estes agonizam conscientemente, de olhos abertos, com a boca seca de tanto gritar e ninguém ouvir.

18 novembro 2011

Defina a mulher. Transforme-a em fruta.

Algumas coisas ganham seus nomes, justamente por serem insuficientes, ou inexistentes. Liberdade por exemplo, qual significado teria se simplesmente fossemos livres? E se não buscássemos a liberdade? Por que definir algo, que não precisa de definição?

Neste viés, a intragável luta por direitos se choca com a intolerável e abundante vulgarização do estereótipo feminino, que de frágil, passou a forte, a fruta, de preferência, fruta proibida. Aos hipócritas e aos machistas de meia calça, mulher pelada às nove horas da noite, pintada na cor do carnaval, é símbolo de liberdade de expressão, é arte, cultura e tradição. Aos olhos das mulheres inibidas pelo conservadorismo neoliberalista, é um desrespeito a classe, uma vergonha explicita. Aos olhos do sistema econômico burguês, mulher é mercadoria, é objeto de desejo, e de consumo, e muitas vezes, se pode comprar. Mulher está na moda, desde os primeiros anos do século XX, quando lutaram por melhores condições de trabalho e de vida, e também por seus direitos ao voto. Lutaram e lutam para se equipararem aos homens ou para passarem os homens? E passaram, passaram longe e chegaram perto de uma vaidade hostil que se impregnou na visão multifacetada, que nós, homens, abstraia, nós seres humanos construímos dia após dia a respeito da mulher, que no âmbito da divisão de classes, rotula-se como independente, auto gestora, consciente de seu papel social, multifuncional, questionadora, arbitrária de suas próprias ações e muito, além disso, acima de qualquer julgamento masculino sob a pena do machismo indissolúvel, contudo a mercê de sua própria condenação, a por uma eternidade, manter-se fruta, sem casca, e muitas vezes, sem conteúdo.

Sobrepõe-se a mulher até mesmo as próprias mulheres, a família, a valorização não só de seu valioso hímen, como de sua comovente caminhada rumo à valorização de si, enquanto coisa, enquanto objeto de troca. Tem bunda no seguro, e não segura mais as pontas, mas segura todas as pontas, desfigurada com a descaracterização de todo seu movimento em prol de ser livre, para se auto afirmar na avenida, no sambódromo, no imaginário masculino, e nas roupas, nos nomes de fruta, na exposição despudorada e sem significados na mídia. Uma luta, cheia de pelegos.

As mulheres frutas, a nudez feminina (e também masculina) no carnaval, a mulher submissa não só ao homem, como a todas as formas de domínio, como a televisão, a beleza, a vaidade, e a sexualização precoce, são os estopins da revolução às avessas. É o caminho contrario ao que as mesmas proporam para a classe, que de classe em classe, tanto se dicotomizou, que já perdeu a classe. Caíram na armadilha ideológica burguesa, lutaram por si, e no auge de seu egocentrismo foram golpeadas com luvas de pelica, transformadas em mais uma classe dentre tantas outras, procurando definições, terminologias, que as expliquem, sem conseguirem ao menos compreender que o contexto de inserção exige abstrações no que tange o entendimento de classes, enquanto uma única. E nesse homem é homem, mulher é mulher, é que as raízes venenosas ramificaram-se, ervas daninhas se alastram por todos os lados, desfrutam de serem frutas comestíveis, e passageiras, são frutas de época, de estação, e os homens debocham da luta, sem razão, mas com razão, por que é injustificável que tantos conflitos tenham sidos findados em meia dúzia de direitos vazios, perdidos na vulgarização do corpo e da alma feminina, a qual respeito e admiro, não enquanto homem, porém, como ser humano, como individuo que preza pela totalidade e concretude nas relações humanas, sejam estas do sexo feminino, masculino, ou qual seja, sem perder de vista, que homens e mulheres são exemplos para si próprios, e seguem estes exemplos históricos, mudando, transformando, e as vezes regredindo.

Esclareça-se que não se trata aqui, ressaltar a guerra dos sexos, muito menos banalizar as conquistas históricas da mulher, que de certo são legitimas e relevantes. Não se trata de dividir mais ainda as classes, nem diminuir uma perante a outra, trata-se de não invisibilizar o cenário que se constrói a cerca dos estereótipos que levam nas costas, todas as minorias, inclusive as mulheres, que recebem as ordens difusas e paradigmáticas de como devem agir para manter a tal independência feminina, e nesse querer a liberdade, terminam por se aprisionar cada vez mais em imagens piores que criam de si mesmas. Basta notar como as meninas se vestem, brincam, imitam sua realidade adulta, deixando a inocência junto com os primeiros anos do século XX quando ser mulher era desigualdade, submissão, e deixando por roupas sensuais, conversas sobre meninos, namoro, maquiagem, vaidade. Antes a repressão tendo o fruto da inteligência, da luta, da integridade e da união do que tendo a mulher como fruta na televisão sendo o referencial de tantas outras.

16 novembro 2011

O Mito da Caverna: Mídia e o desenvolvimento do capitalismo

O Mito da caverna de Platão foi escrito no livro VII de A República mais ou menos 2000 anos antes de Cristo. O que me faz acreditar que ele ainda tem algo de importante hoje? Por que este diálogo de Sócrates com Glauco e Adimato é tão lido e tido como uma das melhores metáforas de todos os tempos? E sobretudo, como podemos interpretá-lo hoje, relacionando-o com o poder instituído e a mídia? Estas e algumas outras questões perpassaram esta minha pequena reflexão.

Como já citei, o mito da caverna foi uma metáfora que Platão utilizou para demonstrar em seu diálogo, através de Sócrates, o quanto os cidadãos estavam presos às crendices e superstições. Sinteticamente? E reelaborando? o mito conta que haviam três homens dentro de uma caverna. Ambos estavam virados para o fundo dela. Nasceram e cresceram assim. Ficavam contemplando a escuridão e apenas um feche de luz lhes era possível enxergar. Contudo, certo dia, um destes, voltou-se para o outro lado e quase que cegado pela claridade vista lá do fundo, foi acostumando seus olhos até que conseguira, aos poucos, sair da caverna. Vislumbrado com tantas cores, com a natureza e a quantidade de coisas diferentes que havia fora da caverna, voltou para contar aos seus amigos. Mas, ambos não acreditaram nele e revoltos com tanta mentira, o mataram!

Platão divide o mundo em duas realidades: a sensível, que se percebe através dos sentidos e a inteligível (ou mundo das idéias). O mundo dos conceitos é onde está toda a verdade e o mundo sensível é apenas uma cópia imperfeita dele. O Bem é a verdade maior e abaixo dele estão as verdades absolutas, fixas, eternas e imutáveis. Para ele, as cadeiras, por exemplo, que sentamos diariamente, são apenas cópias imperfeitas Da Cadeira. Ou seja, apesar de todos os modelos de cadeiras do mundo apresentarem diferenças, existe a cadeira, que congrega em si as características das quais foram copiadas as cadeiras sensíveis. E é assim com tudo o que percebemos no mundo.

É perfeitamente possível relacionar a filosofia platônica, sobretudo o mito da caverna com nossa realidade atual. Para constar, nossa sociedade contemporânea é constituída basicamente do cristianismo e do capitalismo, e o mundo, portanto, numa visão cristã, está dividido em mundo das idéias (céu) e mundo sensível (cotidiano) - o inferno cristão, que parece ter sido tirado da idéia de mundo sensível de Platão, veio depois, vamos desconsiderá-lo aqui -. E numa visão capitalista, o mundo das idéias, ou ideal, parece ser a satisfação de todas as necessidades financeiras e o mundo sensível, sua privação.
A partir desta leitura, posso fazer uma reflexão extremamente proveitosa. Apesar do cristianismo estar muito forte ainda hoje e ter muita influência, inclusive política e midiática, vou deixá-lo de lado também, afim de focar-me em nossa prioridade, no momento: o capitalismo x mídia.

Na verdade, a idéia que trarei de capitalismo seria mais apropriada se chamado de modernidade, pois não estarei me referindo apenas ao sistema financeiro, mas todas suas conseqüências e influências. Quando surgiu, o capitalismo se opôs radicalmente à Idade Média e propunha elevar a humanidade a um patamar superior, melhorá-la, dando acesso ao suprimento das necessidades básicas a todos os seres humanos. Mas, como bem sabemos, não foi o que aconteceu. Nunca houve tantas barbáries na história do ocidente, tampouco tanta exclusão social e degradação humana e do ambiente. Hoje, sei que se ele continuar desenvolvendo-se trará nossa extinção.

Todavia, grande parte das pessoas do mundo todo, não estão muito preocupadas com isso, ou sequer se deram conta do tamanho do problema para todos nós. Isso graças, em grande parte à mídia. Voltando à metáfora da caverna, o capitalismo utiliza-se dos grandes meios de comunicação para poder criar e perpetuar a caverna para a grande massa. De que forma? Uma das formas mais conhecidas é criando necessidades, tidas como essenciais e depois, vendendo suas soluções. Ou seja, hoje é necessidade básica ter computador com acesso à internet. Quem não o tem, está excluído da sociedade, de forma que até o emprego fica difícil conseguir e sendo assim, sem emprego, sem dinheiro pra poder sanar suas necessidades, indigno de participar do convívio social. E o que já não me surpreende é a relevância do mito, por exemplo: hoje existe muita informação denunciando a alienação que causam as novelas (e afins), criando realidades paralelas e preocupações alheias; sobre a forma que os políticos também se utilizam da mídia para esconder a usurpação do poder , as corrupções, etc. Mas, as pessoas, em geral, cotidianamente matam estas informações, escolhendo ainda o fundo da caverna. Será que por uma pré-disposição a serem enganadas? Por mero comodismo? Não nos é possível saber ainda.

Talvez, com o capitalismo continuando a desenvolver-se, com ajuda da mídia, surgirá outra ou outras espécies (até advindas da nossa, quem sabe?) e que dirão: como aqueles humanos conseguiram ficar tanto tempo dentro da caverna?

Achei uma HQ bastante interessante sobre este tema, leia e reflita: